Na “aula zero” do curso de Psicologia, normalmente os professores perguntam o que estamos fazendo ali, por que viemos para a psicologia e o que queremos do curso.
É comum que as respostas levem as cores do idealismo e da empolgação: “quero ajudar as pessoas”, “fui num psicólogo quando criança e foi muito bom, quero fazer o mesmo”. Por outro lado, muita bobagem também é dita, e os “paraquedistas” logo se revelam.
Uns poucos sabem, de verdade, quem são e o que querem com a psicologia.
O tempo vai passando e a mentalidade vai refinando. Quem se dispõe, vai se aperfeiçoando e ganhando maturidade pessoal e profissional, ainda que esteja no ambiente acadêmico.
Chegando ao final da faculdade… pronto! Estamos no “mercado de trabalho”! Novas angústias, novos questionamentos, novo “peneiramento” (dados do CFP apontam que apenas metade dos alunos de psicologia exercem a profissão).
Meio “perdidos” ou pouco conectados a um propósito, uma parcela dos recém-formados vai em busca de alternativas para se sentirem mais seguros: pós-graduação, concurso público ou ambos; tentam a sorte em consultórios ou procuram empregos.
Alguns se destacam, boa parte desiste, mas muitos ficam naquela zona cinzenta, nem ruim demais, nem bom o bastante. Trabalham, mas não se satisfazem, parece que falta algo.
Enfim, o que falta nisso tudo?
Propósito
Acredito que o que difere os alunos e profissionais excepcionais dos medianos é um profundo senso de PROPÓSITO.

Uma consciência firme de quem são, de onde querem chegar, o que querem fazer para chegar, quem mais se beneficiará quando chegarem e (o mais importante) o que ficará DEPOIS que se forem.
Esta é uma definição muito particular de cada um, aquilo que é o meu propósito pode não ter sentido nenhum para você; e o contrário também pode ser verdade.
E essa consciência é independente do nível de conhecimento ou experiência que se tenha. Estes fatores contribuem, mas são periféricos.
Uma pessoa com um propósito claro sabe, inclusive, aquilo que lhe falta e parte em busca de obter, seja em termos de bagagem teórico-técnica, experiência ou competências. Um profissional de amplo conhecimento e experiência, mas que não tenha clareza de seu propósito, exercerá uma psicologia insuficiente para si e para o seu cliente.
Ter um propósito também é diferente de ter um “sonho”. O propósito é muito mais consistente, lastreado com informações, planejamento e clareza do caminho a ser percorrido.
” Alguns se destacam, boa parte desiste, mas muitos ficam naquela zona cinzenta, nem ruim demais, nem bom o bastante. Trabalham, mas não se satisfazem, parece que falta algo.”
E o senso de propósito também baliza a prática profissional. Em última análise, um dos papéis fundamentais do psicólogo é contribuir para aquele a quem atende, seja em qualquer área de atuação, construir e conectar-se ao seu propósito.

Para que esse papel seja desempenhado de forma consistente e eficiente, é imprescindível que o psicólogo esteja alinhado ao seu próprio propósito; assim como um terapeuta só poderá oferecer uma terapia de qualidade se estiver engajado em seu processo terapêutico.
Paradoxalmente, o que tenho visto atendendo psicólogos de todo o Brasil, é que boa parte desses profissionais, que deveriam auxiliar seus clientes a encontrarem um propósito, não tem clareza quanto aos seus próprios.
Comumente, ouço do psicólogo que ele quer trabalhar, “atender as pessoas”, “ajudar em tal demanda”, “ser reconhecido como referência para tal problema”. Isso é importante, mas é só uma parte. A parte que realmente importa é:
Ao atender, o que você quer alcançar?
E assim voltamos ao famigerado propósito.
ok, já sabemos que ele é necessário.Mas como encontrá-lo na prática?
Essa vai ser uma resposta muito particular, mas podemos concluir que o propósito está balizado em quatro dimensões:
- O autoconhecimento: saber quem é, o que quer de si, da vida e da carreira; pontos fortes, fragilidades, competências que possua ou que deseja possuir;
- A dimensão da realização: o que te realiza, te motiva? Quais são as atividades que você faria caso o dinheiro não fosse problema? Se fosse para fazer algo pelo resto da vida, o que seria?
- A dimensão do retorno: não pode haver propósito sem compensação. Se a balança entre o dar e o receber não estiver equilibrada, seu propósito se esgota e passa a ser um fardo. O retorno pode (e deve) ser de ordem financeira, mas isso não é o mais importante, há que se ter uma profunda ligação emocional com o propósito.
- A dimensão espiritual: sem nenhuma conotação religiosa, essa dimensão contempla os aspectos transcendentais de nosso propósito. Para além de você mesmo, como o seu propósito impacta positivamente na vida das pessoas, da sociedade o do mundo? Depois que você for, seu propósito se converterá num legado positivo?
Diante disso tudo, te pergunto, psicólogo(a):
Você tem um propósito de vida e carreira? O que você tem feito atualmente está alinhado com ele?
Ou está te faltando um propósito?

Se estiver, saiba que construir um leva tempo, demanda planejamento, reflexão e investimento de recursos materiais, intelectuais e emocionais. Dá trabalho, mas é muito menos do que a energia necessária para se viver uma vida aquém do que ela pode oferecer.