Alguns psicólogos quando iniciam a terapia com um adolescente apresentam dúvidas em relação a chamar os pais ou não para o processo terapêutico. Vamos falar nesse texto sobre o porquê de chamarmos esses pais a participarem, a importância da participação e algumas dicas de orientação.
A família tem grande importância no processo terapêutico do adolescente. Muitas vezes, vejo psicólogos que trabalham junto a família apenas se o cliente for uma criança. Mas o adolescente também é um ser em construção de personalidade, de caráter e de habilidades sociais.
O adolescente está aprendendo a sair “da corda de proteção dos pais”.
Vou falar pais para simplificar. Sabemos das novas famílias que estão se formando… e entendam pais, aqui, como os cuidadores dos adolescentes. Muitas vezes, teremos que orientar o tio, a avó, o namorado da mãe… algumas vezes por eles serem os cuidadores e outras por serem adultos de destaque e influência para o adolescente.
Os pais não nascem sabendo o que é melhor para os seus filhos, normalmente repetem ou repelem comportamento aprendido com os seus próprios pais. Ouço muito os pais dizerem: “educo meus filhos como fui educado e foi ótimo”, “trabalho demais e ele tem que aprender a se virar, eu aprendi”
Quando os pais apresentam algumas dessas falas, o que faço é perguntar:
– O que você sentia na adolescência em relação as correções que seu pais lhe davam? – por exemplo.
O que escuto muito são os pais dizendo que se sentiam tristes, com raiva. E assim vamos dando continuidade à sessão falando dos sentimentos deles quando adolescentes. Os pais não param para pensar como se sentiam na sua adolescência, só se lembram que ela passou e eles sobreviveram a ela. E acham que será assim com os seus filhos.
Devemos ensinar aos pais a analisarem o porquê do sentimento e do comportamento de seus filhos, agora na adolescência.
O que aconteceu que os fizeram comportar-se de forma X e não Y?

Na orientação de pais ensiná-los a fazer uma Análise Funcional é fundamental. Mas, antes devemos conhecê-los melhor:
- O que os afligem como pais?
- Como eles se sentem ao tomarem certas decisões com o seu filho adolescente?
- Como eles gostariam que essa relação fosse?
- Como eles se veem como pais?
- Como eles gostariam de ser vistos?
Devemos mostrar para eles que não existem pais perfeitos, mas existem pais que querem o melhor para seus filhos mesmo sabendo como é árduo o processo de educar. Sim! Educar não é moleza! E muitos pais se aliviam ao ouvir isso de um profissional do Comportamento, no caso, nós psicólogos. Se sentem acolhidos e compreendidos.
Devemos deixar claro para os pais que eles devem ser pais e não amigos dos seus filhos.
Os filhos precisam de um adulto que lhes dê o exemplo, que seja uma referência de autoridade e de respeito.
Sendo amigos e não pais, eles se tornam uma referência em que os filhos possam se espelhar como adultos saudáveis emocionalmente que serão no futuro. Os pais devem passar segurança aos seus filhos. Que o relacionamento pais e adolescentes não seja de amigos não significa que não possa ser próximo e enriquecedor para ambos.
Mas, devemos deixar claro que uma coisa é ser amigo e outra, bem diferente, é ser pai e filho. Os pais devem ser ao mesmo tempo amorosos e firmes. Normalmente os amigos são apenas amorosos e aí está a grande diferença e onde o respeito pode, muitas vezes, ficar de lado e assim não passar segurança.
Nos textos anteriores eu falei como criar relações autênticas com o adolescente e é essa relação que os pais devem buscar: uma relação transparente. A confiança deve vir de forma espontânea e não imposta pelos pais.

Devemos ensinar aos pais a reforçar os comportamentos adequados dos filhos. Fazer uso adequado de atenção, explicar os porquês de suas escolhas e atitudes, são exemplos de práticas educativas positivas. A ausência de afeto, o relaxamento de regras estabelecidas e a punição inconsistente são exemplos de práticas educativas negativas.
A punição consistente é “punir” com algo que tenha a ver com o comportamento inadequado.
Vamos a um exemplo: o adolescente chegou fora do horário combinado para retorno. Na próxima festa não irá, pois descumpriu o combinado. Esse é um exemplo de punição adequada. E não: O adolescente chegou fora do horário combinado para retorno. Então, ficará um mês sem celular. O que o celular tem a ver com o ocorrido? Se nem você sabe, imagina o pobre adolescente?
Entendeu a diferença? Essa é uma das orientações que não pode deixar de ser apresentada aos pais.
Com a chegada da adolescência os pais têm uma tendência em exigir mais tarefas e responsabilidades dos filhos, mas percebemos que, na maioria das vezes, essas exigências não foram ensinadas.
As regras devem ser sempre claras.
Apenas regras claras serão seguidas e não tem como exigir o que não foi ensinado.
Durante a conversa de acolhimento o terapeuta deve sempre analisar as exigências e queixas desses pais com o filho adolescente. Fazendo-os perceber se existem regras claras, se essas regras são para todos da casa. Assim como as crianças, os adolescentes seguem exemplos.
Abaixo alguns exemplos, que parecem ser óbvios, mas os pais se surpreendem:
- Não tem como exigir do filho que fique menos no celular se você não sai do celular.
- Se seu filho te chama para mostrar algo e você pede para esperar, pois está respondendo um amigo no WhatsApp, ele vai te pedir para esperar quando o chamar, pois também está respondendo um amigo.
- Não tem como exigir do seu filho que ele se interesse por leitura se ele nunca te viu lendo um livro!
O Papel do Terapeuta

E como, nós terapeutas, fazemos com que esses pais percebam que suas atitudes refletem diretamente no comportamento dos filhos?

Primeiramente, devemos lembrar que não somos terapeutas desses pais e sim de seus filhos.
Nossa função como terapeuta de adolescentes é orientar os pais de nossos clientes e não fazer terapia com eles.
Durante o processo, se você perceber que esse pai precisa de terapia para que o seu trabalho aconteça da melhor maneira possível, encaminhe para outro profissional e se policie em apenas orientar esse pai no que diz respeito ao seu cliente adolescente.
E você me pergunta: – Nossa, Renata, mas eu posso ajudar tanto a esses pais na sua própria vida. Pode! Mas, lembre-se sempre que o seu papel, aqui, é de terapeuta de adolescentes e orientador desses pais.
Você pode atender pais como nicho? Pode, claro! Mas não os pais de seus clientes? OK? Nesse caso, você seria terapeuta de um pai e se o filho dele precisar de terapia, você também, vai encaminhar para o coleguinha psi!
Vamos voltar a nossa pergunta: E como, nós terapeutas, fazemos com que esses pais percebam que suas atitudes refletem diretamente no comportamento dos filhos?
Através de perguntas! E como vimos a importância de não fazer terapia com esses pais e sim de orientá-los, podemos abusar um pouco mais das perguntas. Vamos tomar os três exemplos citados acima como base para fazer algumas perguntas.
- Como é o seu uso do celular em casa? Assim os pais vão lhe contar e você pode fazer intervenções, do tipo: – Você acredita que seu filho percebe o seu uso excessivo? Como você acredita que esse exemplo atinge o comportamento do seu filho?
- Você está me dizendo que seu filho não te responde na hora, pois fica no telefone. Você consegue me dizer alguma situação me que ele te solicitou atenção e você não pode atende-lo por estar resolvendo algo ao celular?
- Entendo. Os adolescentes devem ler mais, essa geração não é adepta da leitura. Quero saber um pouco sobre você, e o seu hábito da leitura. Você costuma ter um tempo para leitura? Lia para seu filho quando ele era pequeno? Seu filho vê você lendo revistas, jornais, livros de literatura ou de estudos?
Parece bobo e um tanto lógico para muitos, mas, novamente, os pais não percebem como suas ações afetam diretamente o comportamento dos seus filhos. Esse momento de parar com você, terapeuta e falar sobre isso é fundamental.
E as cobranças sem exemplos dos pais passam a não mais fazer sentido. E o pais que desejam mudar os hábitos dos seus filhos pode aprender a mudar os seus em prol da educação.
O papel do terapeuta é reforçar o papel dos pais no processo de aprendizagem e socialização de seus filhos. Mas, lembre que eles se tornam pais sem que ninguém os tenha ensinado e sendo assim, muitos agem em função do que aprenderam, sem questionar sobre outras possibilidades.
É importante que os filhos aprendam a solucionar os seus problemas e assim ganhem independência. Os pais devem deixar claro que estarão sempre ali, para apoiá-los e aconselhá-los. Os pais também precisam ficar cientes que existem aspectos da vida de seu filho adolescente que eles vão guardar só para eles. Assim como alguns aspectos da vida dos pais devem ser só deles.
Não é bom entrar demais na intimidade, porque cada um tem sua própria história e seu próprio caminho a percorrer. E com a adolescência existem novas descobertas que os adolescentes vão tentar sozinhos. Se os pais estiverem dispostos a ficar atentos em ouvir antes de aconselhar – sem punir – os adolescentes se sentirão mais seguros em trocar suas novas experiências e a pedir aconselhamentos com mais frequência.
O grande segredo!

O filho adolescente, assim como todo ser humano, tende a se comportar diante de reforçamento.
E o reforçar comportamentos adequados dos filhos deve ser uma constante dos pais. Os comportamentos inadequados, comportamentos corriqueiros, como não tomar banho, não fazer a tarefa de casa, devem ser ignorados. Assim o adolescente tende a se comportar de forma mais adequada.
Mas, Renata, você está dizendo que devo aconselhar aos pais que deixem pra lá quando o filho não fizer a tarefa de casa? Mas como esse menino vai passar de ano?
Não!
Estou dizendo que você deve aconselhar aos pais que reforcem quando virem o filho fazer a tarefa de casa.
Com o elogio, esse comportamento tende a ser mais frequente e consequentemente o comportamento de não se fazer a tarefa de casa passa a ser extinto.
Esse é o grande segredo: reforçar comportamentos adequados no lugar de punir comportamentos inadequados!
É difícil, mas não é impossível!
Nessa fase a família já não é mais o centro das atenções do adolescente, sendo comum que ele apresente mais questionamentos e contestações às regras, fato que se faz importante para o desenvolvimento de seu repertório individual, o que muitas vezes não é compreendido pelos pais.
Se conseguirmos num primeiro momento fazer esses pais pararem e observarem quais dos seus comportamentos influenciam o comportamento dos filhos já teremos dado um grande passo para o convívio de pais e filhos.
Após observarem esses comportamentos devemos ensinar aos pais a analisarem o que gerou o comportamento inadequado dos filhos (análise funcional). E sempre ensiná-los a fazer a troca de reforçar os comportamentos adequados no lugar de punir e dar atenção aos comportamentos inadequados.
Vou encerrar esse texto por aqui. Vamos nos falando nos comentários e trocando experiências.
O processo de orientação de pais é um processo de psicoeducação e vamos aprendendo com eles novas formas de educar e tornar prazerosa a relação entre pais e filhos adolescentes.
Minha ideia aqui foi dar algumas dicas que tenho usado ao longo desses anos de clínica e orientação. Quero ouvir a de vocês. 😉
AUTORA
RENATA LOTT
renata@acompanhar.com.br

Sou psicóloga (CRP 04/19886), formada há mais de 20 anos e, desde o meu primeiro estágio, no primeiro ano da faculdade, eu trabalho com adolescentes e seus familiares.
Construí minha clínica especializada em acompanhamento à criança e ao adolescente um ano antes de me formar e, desde formada, atendo – como psicóloga clínica – adolescentes e seus familiares.
Sou apaixonada pela fase da adolescência, fase esta que tantos (leigos e profissionais) imaginam ser a mais difícil, e eu vou te provar no curso o motivo das pessoas, equivocadamente, pensarem assim.